Seis milhões de pessoas afetadas pelo desemprego estão fazendo bico ou tocando o próprio negócio neste primeiro semestre. Somente em 2015, foram abertas 500 mil microempresas.
Desde 2003, o Brasil não tinha tantos trabalhadores apostando nos bicos ou trabalhos informais. São, pelo menos, 6,2 milhões de pessoas que improvisam pra conseguir um salário no final do mês.
Aos 55 anos, Maria Luisa Junqueira se viu fora do mercado de trabalho. Depois de quase 30 anos de carreira em administração comercial, desde janeiro ela se dedica à venda de roupas e acessórios. ‘Busquei associar coisas que já gostava a alguma coisa que coubesse no bolso para conseguir pelo menos equilibrar as contas’, afirma.
O movimento de trabalhadores do mercado formal para o sem carteira assinada ou por conta própria é uma tendência de seis regiões metropolitanas do Brasil que foram analisadas pelo IBGE.
A técnica de Trabalho e Rendimento do Instituto, Adriana Beringuy, explica que existem setores que potencializam este novo comportamento: ‘Cerca de 75% das pessoas que trabalham na indústria estão sob a forma de empregado com carteira. Sendo a indústria uma das atividades que mais tem dispensado trabalhadores, o impacto da dispensa da indústria sob o vínculo da carteira acaba sendo maior que em outras atividades que não estão sob esse registro.’
Seguidos da indústria estão a construção civil e o comércio. Marcos Sabino trabalhava na produção de pneus. Ele está entre os 121 trabalhadores demitidos nesta semana da Fábrica da Pirelli de Santo André, no ABC Paulista. A quebra de contrato foi de uma hora pra outra e agora ele diz que vai abraçar a primeira oportunidade que aparecer. ‘Topo qualquer serviço que aparecer primeiro. Não posso ficar escolhendo’, diz’.
Dados do IBGE indicam ainda que a abertura do próprio negócio, das microempresas, segue uma tendência de crescimento. No Brasil já são mais de cinco milhões das chamadas MEIs. Quinhentas mil delas foram formalizadas só neste semestre.
O superintendente do Sebrae São Paulo, Bruno Caetano, conta que hoje a cada dez pessoas que buscam orientação do serviço, pelo menos três estão desempregadas. ‘O caso mais comum é a pessoa que perdeu o emprego, passa pelo período do seguro-desemprego, resgata o Fundo de Garantia e enxerga no empreendedorismo a chance de manter o nível de renda da sua família. O sonho de virar patrão como alternativa à crise’, afirma.
Ainda segundo o superintendente, até junho do ano passado, este perfil de empreendedor era raro nos escritórios do Sebrae: ‘Muda o tipo de empreendedorismo. Antigamente era por oportunidade, e agora cada vez mais por necessidade.’
Entretanto, para o mestre em Administração pela USP e especialista em finanças, Gustavo Cerbasi, trabalhos mal qualificados tendem a ser mal reconhecidos. E esta saída de agora para driblar a falta de salário pode não ser a solução. ‘Aquela carreira a qual a pessoa se dedicou até agora, que neste momento de crise poderia ser reforçada por estudos, está sendo substituída por uma carreira secundária mal qualificada, com trabalho frágil perante a percepção do consumidor. Esse própria mudança de carreira vai significar lá na frente, quando a economia se recuperar, na incapacidade da pessoa se manter naquilo que era o trabalho original dela. Isso faz com que, na hora de disputar um emprego, talvez aquele que se preparou melhor para um momento de crise ocupe a vaga daquele que teve que correr atrás de um bico para sobreviver.’
Ainda segundo o especialista, microempresas que nascem por necessidade tem sobrevida ainda menor que a média, que é de até dois anos. Ele acrescenta que as franquias são negócios menos rentáveis, mas sobrevivem melhor e por mais tempo.
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